Como um Quick de Morango
Recentemente um amigo meu se separou de uma garota aí, com quem
vivia na São Paulo dos “corações solitários” (reler o conto
de Rubem Fonseca), e me disse que estava de “volta ao mercado
mulherístico” e que precisava fazer uns exercícios, pois estava
se sentindo como um “Quick de morango com a data de validade
vencida”.
Pensei em escrever uma história sobre um sujeito comum que vê no
declínio do corpo a própria impossibilidade de conseguir uma outra
garota. Vive essa angústia. Vive os 45 anos dentro de 30. Mas ele
não faz nada por si. E no desatino - e sem saber exatamente por quê
- passa a frequentar, mais e mais a cada dia, supermercados e
pequenos mercados e, lá, fica por horas e horas observando a data de
validade dos produtos.
Nessa obsessão, percorre quase todos os supermercados da cidade, mas
é num mercadinho simples da periferia que descobre o paraíso:
inúmeros produtos vencidos. E num desatino de felicidade e êxtase
(três quatro cinco produtos seguros pelas mãos suspensas no ar – a baba escorrendo – o caldo do queijo minas escorrendo – lembra que
a “ex” era mineira – o alívio escorrendo-lhe pelo ombro –
as costas enfim distensionam – e ele ri, ri, ri), e nesse disparate
todo ele encontra os olhos repressores da dona do estabelecimento,
que viera saber se não se tratava de algum fiscal da Prefeitura
aporrinhando de novo.
Esclarecido o equívoco – bem esclarecido: que ele não era nenhum
louco, tampouco fiscal – , o amor (perdido nela, também, pois
viúva de marido vivo) o amor se faz entre as partes, sem prazo de
validade ou queijo minas (porque em verdade nenhum dos dois gostava
de queijo minas).
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