Pisca-Fedor
CRÔNICAS PARA MEU FILHO
O colorido no olhar das crianças. A percepção sensorial e mágica dos pequenos – tudo isso encanta a adquirida comodidade férrea dos adultos. Penso nisso enquanto estou aqui sentado, escrevendo, inútil tentativa de dispor da espontaneidade lúdica da primeira infância em benefício próprio. Dez minutos atrás, dirigindo o carro pela grande avenida de nosso bairro e falando o tempo todo com meu filho de cinco anos, eram tais as sensações que brotavam de nossa conversação. O que registro aqui, agora, é soma daquelas emoções. Como um inventário, folha de papel, recuerdo sobre o qual, um dia, ele possa se deitar.
Então, hoje à tarde, quando descíamos a Avenida Wensceslau Escobar e avistamos à nossa frente uma velha Kombi em marcha lenta, numa velocidade claudicante daquelas em que o carro pede marcha, chamou a atenção de meu filho o fato de que a tampa do motor estava aberta. Sua alegria e empolgação traduziram-se em rápidas observações sobre o estado geral de conservação do veículo. Aquela barulheira generalizada. Ele tinha diante de si um “fato”, um acontecimento espetacular diante de seus olhos, e rindo começou:
- Olha ali, pai, o pisca-pisca está ligado e o homem da Kombi está com o braço pra fora.
Expliquei-lhe que o motorista devia estar com problemas no motor, e por isso segurava, ele mesmo, um arame relativamente grosso que, espichado, ia até a porta traseira onde fica o motor. Um provável cabo de acelerador improvisado de última hora. O barulho daquele carro era ensurdecedor.
A velha Kombi ficou para trás; não na imaginação do meu filho. Pois sem delongas foi logo me dizendo que também os caminhões de lixo andam com o pisca-pisca acesso o tempo todo. Comecei a explicação de que... Parei. Lembrei que às vezes os adultos são muito chatos tentando explicar. Deixei-o terminar sua história – e então ele me disse:
- Podiam inventar o pisca-fedor, não é pai? Aí a gente ia saber quando o caminhão estivesse fedendo a lixo.
Ri. As imagens de pessoas correndo do caminhão do lixo com o pisca-fedor ligado, carros desviando do truque, insultos, buzinas, um escândalo sonoro e luminoso aos olhos de um adulto raso de idéias, carente de imagens. Este era eu. Meu filho também ria.
Então, hoje à tarde, quando descíamos a Avenida Wensceslau Escobar e avistamos à nossa frente uma velha Kombi em marcha lenta, numa velocidade claudicante daquelas em que o carro pede marcha, chamou a atenção de meu filho o fato de que a tampa do motor estava aberta. Sua alegria e empolgação traduziram-se em rápidas observações sobre o estado geral de conservação do veículo. Aquela barulheira generalizada. Ele tinha diante de si um “fato”, um acontecimento espetacular diante de seus olhos, e rindo começou:
- Olha ali, pai, o pisca-pisca está ligado e o homem da Kombi está com o braço pra fora.
Expliquei-lhe que o motorista devia estar com problemas no motor, e por isso segurava, ele mesmo, um arame relativamente grosso que, espichado, ia até a porta traseira onde fica o motor. Um provável cabo de acelerador improvisado de última hora. O barulho daquele carro era ensurdecedor.
A velha Kombi ficou para trás; não na imaginação do meu filho. Pois sem delongas foi logo me dizendo que também os caminhões de lixo andam com o pisca-pisca acesso o tempo todo. Comecei a explicação de que... Parei. Lembrei que às vezes os adultos são muito chatos tentando explicar. Deixei-o terminar sua história – e então ele me disse:
- Podiam inventar o pisca-fedor, não é pai? Aí a gente ia saber quando o caminhão estivesse fedendo a lixo.
Ri. As imagens de pessoas correndo do caminhão do lixo com o pisca-fedor ligado, carros desviando do truque, insultos, buzinas, um escândalo sonoro e luminoso aos olhos de um adulto raso de idéias, carente de imagens. Este era eu. Meu filho também ria.
As crianças formam belas imagens em nossas cabeças.
2 ComentÁrios:
Lindo! Adorei: "adquirida comodidade férrea dos adultos"! O pequeno sentirá muito orgulho.
Realmente. Uma vez o filho de uma amiga, quando pequeno, viu uma senhora imensa de gorda passando na rua. Ele falou com a mãe, apontando pra senhora: "mãe, aquela mulher deve ter um peido cardíaco". Além de tudo, um poeta.
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