quinta-feira, 30 de novembro de 2017

O pequeno bunker

 Escuro, fechado. Três metros por quatro. Semelhante a um ambiente lacrado, de propósito. A inutilidade de uma única porta, trancada e sem trinco. De resto, há poucas informações ao redor, algo para se agarrar. Não fossem alguns ganchos e buracos espalhados, furos e pregos já carcomidos pelo tempo, seriam somente quatro paredes vazias. Quase nada indica que já tenham sido ocupadas um dia. A hipótese: talvez uma sala abandonada, um quarto desfeito, um escritório que nunca foi escritório. Quem pergunta é um homem de cerca de 60 anos – e ele está preso ali, no pequeno bunker.
Assim acredita esse velho homem – e suas ideias algum dia nazistas. Mas o que estaria ele fazendo ali, naquele quarto compacto e obscuro, sem chave ou janela, numa espera que não é mais de se esperar? E o que lembra? Quando foi mesmo que passou a morar ali? Quem o colocou naquele ambiente lacrado, apartado do resto do mundo? O que era seu mundo, mesmo?
Fecha os olhos, e a única lembrança vem de um certo cheiro que identifica. Tão longe, tanto tempo atrás. Seria das crianças, os gêmeos, chorando. Pequenos, ainda bebês, eles acordavam (sempre um acordava o outro) e choravam bastante pelo resto do escuro da noite, e assim fazendo acordavam a irmã mais velha. A menina nunca conseguia dormir direito.
Agora lembra o desconforto que era quando ela não dormia tudo que precisava; o choro dos irmãozinhos era aterrorizante. E ele chorava junto, um grito alto, mais alto, na garganta, até o fim da noite.
Esse senhor, hoje, nos seus tantos anos de vida, agora lembra, sim, do quarto que construíra para a filha. Ainda que ficasse dentro da casa, era isolado; absolutamente vedado, e sem a mínima possibilidade de se ouvir o berro estridente daqueles dois seres meninos. A chorarem. A acordá-la. Isso tudo vem à sua lembrança num flash sem luz. A filha perguntando: pai, por que eu tenho que dormir num quarto tão escuro? O medo da garota diante daquela escuridão. Depois no quarto, ela dormia, nunca acordava. O isolamento era bom, profundo. O pai, este senhor, hoje, preso no quarto, era quem respondia: é para os maninhos não te acordarem. E a partir de então os pais conseguiam dormir.

Um dia ele acordou, estava num quarto, e era bastante escuro; era noite durante o dia; o mesmo lugar onde está agora, a refletir, inquieto, o que foi que eu fiz com a minha filha? Depois silêncio, noite, enfim.


Novembro de 2017

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