Harmonia
No meio da tarde, levantei-me, desci as escadas e fui em direção ao parque defronte ao escritório. Ao entrar no perímetro do descampado, deparei-me com um cão de grande porte. Ele interrompeu a sua corrida, parou diante de mim, olhar maciço. Senti sua respiração na ponta do meu terno. Em seguida me cheirou. A fragrância dos perfumes da gaveta da minha mesa; a falta de banho; o café recém-torrado na cozinha do décimo segundo andar, algo nele rodeava dentro de mim.
Larguei a faca.
O cão lambeu as últimas linhas vermelhas daquela lâmina.
Virei-me. Olhei ainda uma vez, imaginando em que parede ficar o almoxarifado, suas caixas, o volume caído no lado direito da sala. Eu já não tinha motivos para retornar àquele prédio. Senti a harmonia dos passos quando segui em frente, vencendo alamedas daquele parque.
Agosto de 2022.